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Serpro quer mostrar que é capaz ‘de dar retorno’, diz presidente

Notícias - 11 de setembro de 2023

Serpro quer mostrar que é capaz ‘de dar retorno’, diz presidente

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*Artigo publicado originalmente no Valor Econômico, no dia 11 de Setembro de 2023

Fora da mira das privatizações depois de quase três anos, o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) quer provar que tem as condições de “dar retorno” à União, o seu principal acionista. A definição é do diretor-presidente da estatal, Alexandre Gonçalves de Amorim, nomeado em fevereiro para o cargo pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Criado em 1965, o Serpro é a empresa de tecnologia da informação do governo federal, embora também tenha Estados, municípios e companhias privadas entre seus clientes. Entre as 100 bilhões de transações anuais de informação que de alguma maneira passam pela estatal, se encontram dados do Imposto de Renda (IR), do Portal Único do Comércio Exterior e da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran). A companhia chegou a entrar em 2020 na lista de privatizações do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas o processo não avançou.

“O Serpro é um instrumento de soberania nacional”, diz Amorim, que é sociólogo e gestor público municipal por formação e que atua há 20 anos com administração pública e corporativa. Ele tem passagens por diversos cargos nas prefeituras de São Paulo, incluindo na gestão do ex-prefeito Bruno Covas (PSDB), e São José dos Campos (SP). Também foi diretor-presidente de Instituto das Cidades Inteligentes (ICI).

Como justificativa para a necessidade de a empresa ser estatal, o diretor-presidente cita principalmente a importância de o governo federal ter “dados e informações” da população para elaborar políticas públicas.

Amorim tem se reunido com deputados federais do PT, como Lindbergh Farias (RJ) e Reginaldo Lopes (MG), a fim de “sensibilizar os parlamentares” caso surja “outra onda” favorável à privatização da companhia.

Atualmente, a empresa tem colocado Fazenda como prioridade os projetos do Ministério da Fazenda, como a Nota Fiscal eletrônica do Ouro, o Remessa Conforme e as mudanças na legislação de apostas eletrônicas.

“Fiz todo um rearranjo para deslocar uma quantidade de recursos humanos que atendesse os projetos prioritários da Fazenda”, afirma, destacando que as entregas para a pasta estão todas sendo realizadas “dentro do prazo”.

Outras prioridades são concentrar todos os dados do governo federal em uma única nuvem do Serpro (algumas dessas informações estão em nuvens particulares) e “qualificar o nosso pessoal em novas tecnologias”. Neste ano, os investimentos em tecnologia, sejam para modernização de equipamentos ou treinamento de funcionários, serão de R$ 340 milhões. De acordo com Amorim, há neste momento “zero risco” de que surja algum problema “de funcionamento das plataformas”.

Se não investirmos logo na qualificação e novas tecnologias, teremos problemas de sustentação”

“Mas, se não investirmos logo na qualificação e em novas tecnologias, em um ano, um ano e pouco, começaremos a ter problema de sustentação”, afirma. Também foi aberto em julho concurso para a contratação de 602 funcionários para o Serpro – atualmente a empresa tem 7,7 mil funcionários.

No ano passado, o faturamento da companhia foi de R$ 3,8 bilhões, com pagamentos de R$ 740 milhões em dividendos ao governo federal. A maior parte dos recursos vem de contratos com o governo federal, principalmente com Secretaria do Tesouro, Receita Federal e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Além disso, a empresa também vem buscando expandir a sua lista de clientes, com Estados e municípios. Há, por exemplo, contratos já assinados ou na reta final de serem assinados com cidades como Rio de Janeiro e Florianópolis.

“Mas para isso precisamos todo dia abrir a lojinha, colocar a verdura na rua e vender”, afirma. O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 prevê ainda R$ 314 milhões para o Serpro ligados a “gestão e manutenção das empresas estatais federais”.

Apesar dos números positivos do ano passado, a prioridade da empresa não é o pagamento de dividendos para a União. “O sentido do nosso serviço é devolver para o Estado o que temos de capacidade [operacional]”, diz. “Precisamos investir, produzir e entregar mais para o Estado, cobrando menos.”

Como exemplo, ele cita contrato do Serpro com a Receita que será renovado em novembro. Se os termos atuais fossem corrigidos pela inflação observada, a Receita precisaria pagar R$ 1,9 bilhão para a empresa. “Mas vamos cobrar R$ 1,7 bilhão, incorporando dois serviços a mais”, afirma.

Para Gustavo Justino de Oliveira, advogado e professor de Direito Administrativo da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), uma eventual “desestatização” de empresas como o Serpro ou a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) “deve ser avaliada com muita cautela”. Um dos motivos é que “grande parte dos dados ali geridos dizem respeito à seguridade social, à defesa do Estado”. Também há “outros que se vinculam à soberania nacional e ao interesse público”.

“Assim, uma eventual tentativa de privatização teria que lidar com inúmeras alegações de violação à Lei de Segurança Nacional e à própria Lei Geral da Proteção de Dados (LGPD), que veda o tratamento desse tipo de dado por pessoas jurídicas de direito privado sem capital integralmente constituído pelo poder público”, afirma. Como alternativa, Oliveira sugere “o estabelecimento de parcerias público-privadas junto a empresas especializadas”, mas “mantendo sob controle estatal a atividade-fim” do Serpro.